Imagine uma modelo de passarela perfeita, com aparência impecável, poses precisas e disponibilidade 24 horas por dia — sem precisar de voos, maquiagens ou alimentação. Agora, imagine que essa modelo não existe de verdade. Essa é a nova realidade que a inteligência artificial está trazendo para o mundo da moda.
Nos últimos meses, diversas marcas de moda de luxo e streetwear começaram a substituir modelos reais por avatares digitais hiper-realistas. A promessa? Reduzir custos, otimizar campanhas e manter um controle criativo absoluto sobre cada detalhe da imagem. A consequência? Um novo cenário que está mexendo com o mercado, com as agências e, principalmente, com os profissionais humanos da indústria.
A ascensão das modelos digitais
Empresas como Lalaland.ai e The Diigitals criaram modelos totalmente digitais — como Shudu, considerada a “primeira supermodelo virtual do mundo”, com traços africanos, curvas perfeitas e uma presença marcante. Essas criações estão sendo usadas por grandes marcas para editoriais, campanhas e até desfiles virtuais.
A lógica por trás disso é simples: com a IA, uma marca pode gerar centenas de variações de imagens com diferentes roupas, cenários e estilos em questão de minutos — sem equipe de produção, sem estúdio e sem cachê. Além disso, esses avatares nunca envelhecem, não adoecem e estão sempre disponíveis.
Por que isso está preocupando?
Apesar da inovação, o uso de modelos geradas por inteligência artificial tem gerado fortes críticas. Há três principais preocupações no setor:
1. Impacto no emprego
Fotógrafos, maquiadores, stylists e, claro, modelos reais, podem ver suas oportunidades de trabalho reduzidas à medida que mais campanhas optam por imagens digitais. O receio é que uma parcela significativa da indústria criativa fique obsoleta.
2. Padrões irreais de beleza
As modelos criadas por IA geralmente seguem padrões estéticos idealizados: pele perfeita, corpos simétricos e proporções inalcançáveis. Isso pode reforçar ainda mais os já tóxicos padrões de beleza existentes, dificultando a inclusão e a valorização da diversidade real.
3. Falta de representatividade real
Embora algumas modelos de IA tenham traços de diferentes etnias ou estilos, elas não vivem essas realidades. Isso levanta uma questão ética: é correto usar a aparência de uma mulher negra, por exemplo, sem contratá-la de fato ou envolvê-la na criação?
Um novo mercado ou uma ameaça ao antigo?
Há quem defenda que a IA pode ser uma ferramenta complementar, e não uma substituição. Ela pode ajudar pequenas marcas sem orçamento a criar campanhas visualmente atrativas, ou permitir testes rápidos de combinações antes de uma sessão real. Mas, para isso, é preciso ter consciência e responsabilidade no uso dessas tecnologias.
O futuro será híbrido?
Se há algo que a moda sempre ensinou é que ela se reinventa. Assim como a fotografia não matou a pintura e o streaming não eliminou o cinema, a IA pode encontrar seu lugar ao lado dos profissionais humanos — desde que exista ética, regulação e equilíbrio.
Enquanto isso, o debate segue quente: as modelos digitais estão apenas começando, mas já estão balançando as estruturas de uma indústria inteira. Resta saber se elas serão vistas como aliadas criativas — ou como o início de um colapso no glamour real das passarelas.
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